Monday, January 28, 2008

Quem não tem presente se conforma com o futuro

Quando tinha 13 anos, B. foi com a mãe retirar as fotos do Natal – na época, foto era algo que se tirava em máquinas analógicas e que se esperava algum tempo para que fossem reveladas – e ficou pasma como que viu: ela descobriu que era gorda. Engraçado, ela não se via exatamente daquela maneira no espelho, mas era fato, as fotos não mentiam: ela estava gorda. E a sensação de se ver assim era muito desagradável. B., então, decidiu que não tiraria mais fotos até emagrecer. Quem sabe até o seu aniversário ela estaria mais magra? Ou então até o próximo Natal? A decisão estava tomada: não tiraria mais fotos até ficar magra. Aliás, ela também não iria a festinha nenhuma até emagrecer. Não flertaria com nenhum menino. Não seria feliz até emagrecer. Porque felicidade não ficava bem num manequim 44. A felicidade só era compatível com a sua imagem idealizada de magra. Para tudo havia um padrão, e com a felicidade não seria diferente.

E B. seguiu em frente em busca da melhor forma para a sua felicidade. Fez a dieta da lua, da proteína, dos pontos. Fez sessões exaustivas de ginástica, passou os mais variados produtos na pele. Perdeu quilos em poucas semanas, e depois ganhou o dobro deles em uma.

B. tem agora 25 anos. E não tem fotos da adolescência. Nem da fase universitária. B. nunca emagreceu. E nunca foi tão gorda assim.

Nem feliz. B. caiu numa cilada que armou para si mesma: a de impor condições para a própria felicidade.

Mude-se a inicial por qualquer outra letra do alfabeto, e também o objetivo. B. é só um exemplo. Existem milhões de Xs, Ys e Zs que pensam só poder ser felizes quando diminuírem as orelhas de abano, forem ricos ou morarem em outra cidade. E muitas vezes, ao contrário da minha infeliz B. fictícia, elas conseguem atingir seus objetivos. Mas que engraçado, mesmo assim, elas não conseguem sentir aquilo que elas esperavam sentir. Por que será?

Ora, porque quem adia a felicidade é feliz de um modo torto; é feliz em adiar a felicidade. Para estas pessoas, a verdadeira felicidade é aguardá-la. Quando fez a cirurgia nas orelhas, X começou a implicar com o nariz, é claro, porque do contrário, ele estaria feliz, e ele não sabe muito bem lidar com isso. Tendo atingido a felicidade, o que ele faria com ela? Ele não está acostumado com isso. X não sabe ser feliz. X só sabe esperar pela felicidade. Esta é a sua especialidade: aguardar o futuro, ignorando o presente.

O problema é que quando o futuro chega, não há passado, não há experiência. E quando não se tem passado, é como estar numa estrada reta, sem placas de sinalização, nem árvores, nem nada: nenhuma referência. Tudo é igual. E nesta situação nos sentimos perdidos. Não sabemos em qual trevo entrar. Não sabemos aproveitar a felicidade quando ela chega. Nós a tratamos como aquele hóspede que julgamos ser muito exigente, ficamos sem jeito de recebê-la, só porque não temos os melhores lençóis, nem o melhor vinho para oferecer. Não, não, não. Não temos condições de hospedá-la da melhor forma, e se não for da melhor forma, não pode ser de forma nenhuma. Volte outra hora, volte quando estivermos melhor preparados. E ela, que na sua simplicidade, só queria uma porta aberta, vai embora, em busca de melhores anfitriões, que são simplesmente os que demonstram prazer em receber.