Wednesday, January 30, 2008

Nothing is gonna change my world


Jude observa seu campo particular de morangos eternos: "é preciso cultivar nosso jardim"


A inspiração vem de todos os lados...

Fui ao cinema assistir ao filme Across the universe pela segunda vez, e mais uma vez, saí da sala do cinema levitando, apesar de a cabeça estar pesada de idéias.

Como se passa na época da gênese da contracultura, há uma personagem, a Lucy, que é superidealista e participa de um grupo de pacifistas contrário ao envio de jovens americanos à Guerra do Vietnã. Ela se envolve tanto com sua luta, que acaba deixando em segundo plano o seu namorado, o Jude, que, é claro, fica puto com isso.

As duas personagens são faces de uma mesma moeda. Jude também vive neste mundo, portanto, de um jeito ou de outro, é afetado pelos rumos que ele toma. Lucy tem mais consciência disso, e tenta interferir nesta trajetória do mundo.

Só que não adianta. No final das contas, os pacifistas também constroem bombas – assim como o próprio John Lennon teve ligações escusas com o IRA (sinal de que ele não era tão “give peace a chance” assim, ou era, só que para ele, a palavra “paz” tem um sentido diferente do sentido que os outros dão, assim como “democracia” tem sentidos diferentes para a esquerda e para a direita, e “justiça”, para palestinos e israelenses...). Os pacifistas também são humanos, e como todos os humanos, fazem besteira, muitas vezes – acho que quase sempre – as mesmas dos seus inimigos, o que me faz pensar se não estamos todos brigando pela mesma coisa em conversa de surdos. É esta a dúvida cruel de Hamlet quando ele se pergunta: “Ser ou não ser, eis a questão!” Hamlet tem duas escolhas: aceitar covardemente que seu tio tenha assassinado seu pai para tomar o trono, ou honradamente vingar o pai, assassinando o tio e tomando o tr... ops, peraí: mas, neste caso, não estaria ele cometendo a mesma infâmia que o tio? A vida nos coloca em cada encruzilhada... (Parêntese: você já leu Hamlet? Pois então leia, leia já, pare agora de ler este blog – outra hora você volta e termina de ler – e vá atrás de uma edição de Hamlet, não ouse morrer sem antes ler Hamlet!!! E leia com atenção, porque cada frase, cada singela linha, é como aquelas caixas de presente que tem outra caixa por dentro, que tem outra e mais outra, uma loucura! – e uma lucidez impressionante!)

Lucy condena Jude, que vive só em seu mundo, fazendo seus rabiscos (no filme, Jude é artista plástico), enquanto o mundo está se destruindo. Pobre Lucy, não percebe que a alienada é ela. Ela é que vive num mundo de sonhos. Ela é quem vive no céu. E rodeada de diamantes.

Penso como a letra da música Revolution, que Jude canta para Lucy:

You say you want a revolution
Well you know
We all want to change the world

You tell me that it's evolution
Well you know
We all want to change the world

But when you talk about destruction
Don't you know you can count me out

Don't you know it's gonna be

Alright
Alright
Alright

You say you got a real solution
Well you know
We'd all love to see the plan

You ask me for a contribution
Well you know
We're all doing what we can

But if you want money for people with minds that hate
All I can tell you is brother you have to wait

Don't you know it's gonna be

Alright
Alright
Alright

You say you'll change the constitution
Well you know
We'd all love to change your head

You tell me it's the institution
Well you know
You'd better free your mind instead

But if you go carrying pictures of Chairman Mao
You ain't going to make it with anyone anyhow

Don't you know it's gonna be
Alright
Alright
Alright

oh, oh, oh, oh, oh, oh, oh, oh, oh, oh, oh, alright,
alright, alright, alright, alright, alright, alright,
alright, alright, alright, alright, alright...

Acho esta letra fantástica! É claro que todos queremos mudar o mundo, mas como? Ah, você tem a solução? Qual? Existem 6 bilhões de pessoas no planeta, acha mesmo que todas as outras 5.999.999.999 vão concordar? Acredita que consegue convencê-las todas? Creio que não. A não ser que use a força para isso, mas aí... Hamlet.

Não quero dizer com isso que estou me lixando para o mundo. A questão é que querer transformá-lo todo é uma luta inglória. Mas há uma medida possível: nunca esqueço de algo que Renato Russo disse naquele álbum ao vivo Como é que se diz eu te amo, “Consertar a gente já ajuda pra caramba!” A maioria dos militantes acusa os “alienados” de se preocupar de menos com o mundo e demais com seus próprios umbigos. Pois é justamente isso que eu recomendo aos militantes: olhem um pouco mais para seus próprios umbigos! Vocês descobrirão coisas incríveis, muitas tendo muito o que consertar!

Jude diz, a certa altura, que seu problema é não ter causa nenhuma. Ele está enganado. Ele tem. Mesmo sem saber, está seguindo o conselho de Voltaire de cultivar seu próprio jardim. Assim como eu.

Mudar eu mesma é a minha causa. Esta é a minha maior utopia. E sei que utopia é um lugar que não existe, mas o que imorta é o tanto que eu caminho em direção a ela, como diz Eduardo Galeano:

Eu caminho dez passos, ela se afasta dez passos;
Eu caminho vinte passos, ela se afasta vinte passos;
Eu caminho trinta passos, ela se afasta trinta passos.
Para isso serve a utopia:

Para caminhar.

; )